O Futuro de uma Ilusão



Segundo alguns pesquisadores, a razão de termos crença – e não me refiro apenas as nuances religiosas – está profundamente relacionado com nosso processo evolutivo. Nossos ancestrais olhavam para um trovão e creiam que aquilo era uma manifestação divina de alguma entidade superior e, logo, deveria entregar oferendas e fazer orações para acalmá-la. Nem sempre funcionava, mas o que importava, era a falsa ideia que nossa fé era capaz de mudar as coisas além de nós. Com o passar do tempo, fomos apresentados a novas formas de crenças e, independentemente de você crer ou não, é inegável o poder que acreditar em algo – mesmo sem explicação – tem na vida das pessoas. Muitas vezes, é isso que traz sentido ao caos que é nossa vida. Depositamos nossas esperanças em algo que, entendendo ou não, está aí para nos reconfortar e trazer o tão sonhado equilíbrio ao caos reinante.  E, indo contra a lógica, quando nada acontece, parece que a fé fica ainda mais forte.

Esse nosso passado altamente crédulo, não se reflete apenas a fenômenos de cunho espirituais/religiosos. Trazemos isso para muitas esferas da nossa existência: acreditamos que aquela pessoa que amamos, mas que nos faz sofrer, um dia irá notar o mal que nos faz e irá, num passo de mágica, mudar seu comportamento; temos fé que, apesar de todo mal que ocorre a nossa volta, ele nunca irá nos acometer. Estes são apenas dois exemplos de como nossa mente pode acreditar em algo, mesmo que não haja explicação lógica.

Naturalmente, migramos esse conceito de fé para outros ramos da nossa vida, como a política. No cenário atual, somos bombardeados por denúncias e mais denúncias de corrupção que mergulharam o Brasil num caos econômico e institucional que parece não ter saída. Sendo assim, é fácil acreditar num messias que irá, contra tudo e contra todos, recolocar as coisas nos eixos. Ainda que seu discurso seja tão leviano que não deveríamos nos importar, ou repelir com veemência, neste cenário estranho, ele toma um vigor inacreditável. Já vimos isso num passado recente. Collor, FHC (este em menor escala, mas ainda sim, presente), Lula, Dilma, são todos personagens que de uma forma ou outra despontavam como seres quase abençoados que acabariam com a opressão de um sistema corrupto nos entregando um Brasil digno.

Independente de quanto tais personagens foram ou não bons (e para mim, nenhum se salva), todos foram vórtices de nossa esperança quase cega de trazer um futuro melhor. O que se viu foram melhorias localizadas e sem um plano de ação continuo e futuro. Apesar de, alguns deles terem mudado algo na superfície, os paradigmas continuam os mesmos e não é de assombrar que muitos dos que hoje são acusados por desvios nas Lava-Jatos da vida, eram os mesmos do passado.

Mesmo com todo esse passado de crenças equivocadas, somos impelidos a continuar acreditando que alguém irá fazer a diferença. Mesmo envolto numa atmosfera de leis estúpidas e paternalistas, acreditamos que são apenas obstáculos que alguém que não participa das tramoias parasitarias (e quanto a isso, tenho minhas dúvidas quanto a idoneidade de qualquer político) há de vencer. Talvez nosso passado crédulo é mais forte e latente do que nossas próprias experiências. Sou extremamente esperançoso em relação a assuntos de menor escala: acredito que pessoas ruins possam melhorar, mesmo que não deem sinais disso; que coisas ruins que acontecem a minha volta não irão me ocorrer. Mas, naquilo que se refere aos rumos do Brasil, sou totalmente cético. Nossas instituições estão podres, nossos políticos estão podres e suas atuações, quando não são vergonhosas são quase inexistentes. Sabem muito bem usar um discurso ideológico potente, mas que contrasta com sua atuação na vida pública devolvendo muito pouco à população que lhes banca com somas absurdas. Ainda que bem intencionados (se é que exista algum bem intencionado), estão cercados por um mar de lama que faria Mariana ter inveja. Neste cenário, é pouco risível que alguém traga a verdadeira justiça que esperamos. 

Mesmo pensando assim, torço muito para estar equivocado. Sim, apesar de meu ceticismo, torço para que algum herói montado num cavalo branco entre em cena e acabe com todos os vilões – meu lado crédulo é bem forte. Enquanto isso não ocorre, nos resta olhar para os céus e orar para que a próxima entidade a ser o líder máximo do panteão, consiga acalmar os trovões que acometem nossa vida pública. Quem sabe, tenhamos mais sorte que nossos ancestrais.   

[RESENHA] "Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?" de Philip K. Dick



Muito do que se discute hoje em ciência é a implicação da consciência. Muitos debates sobre a questão do aborto – além de pressupostos religiosos – é o embate em saber se crianças que ainda não nasceram tem consciência ou não. Muitos olham para o futuro da Inteligência Artificial com um certo receio: e se as máquinas, tomando consciência do seu poder, resolvessem dominar a Terra acabando com os humanos?  Esses dois exemplos servem para ilustrar o quão forte é o impacto da noção de consciência tanto em nós humanos e, num futuro talvez não muito distante, nas máquinas.

Escrito em 1968, “Androides sonham com ovelhas elétricas?”, é uma ficção científica escrita por um dos gênios da área, Philip K. Dick. É o livro que serviu de base para um dos maiores cults do cinema de ficção cinetífica: “Blade Runner: o caçador de Andróides”, dirigido por Ridley Scott. Apesar de ambas apresentarem o mesmo escopo, em alguns pontos elas são bem distintas. Ainda assim, conseguem trazer à tona questões filosóficas e ideológicas que, em nenhum outro tempo da história, foi tão necessária quanto agora.

O livro se passa numa São Francisco futurística desolada. Uma terceira guerra  mundial com artefatos atômicos eclodiu tornando a biodiversidade quase inexistente. Neste cenário que Rick Deckar, um caçador de androides acaba entrando em uma missão para eliminar  - o termo usado é aposentar - seis exemplares de um modelo altamente desenvolvido de robos, o Nexus-6.

Antes de qualquer coisa é importante salientar o momento histórico em que o livro foi escrito. Aquela década, 1960, ficou marcada pelo forte antagonismo entre EUA e URRS: a corrida armamentista que teve seu ápice na crise dos mísseis de Cuba, que em 1962 quase culminou com uma Terceira Guerra Mundial, e a corrida espacial com os americanos conseguindo pisar no solo lunar no final daquela década. Esses dois fatores estão muito presentes na obra. 

Como toda boa ficção científica, o cenário é muito bem construído. O autor vislumbrou como seria um mundo devastado pela guerra nuclear e isso reflete na biodiversidade escassa, uma atmosfera poluída, pessoas geneticamente prejudicadas pela radiação. Eram todos temores que assombrava a população da época e o autor soube usar muito bem retratando não só como ficou o espaço físico, mas como isso repercutiu em nossa mente. 

Mesclado a este temor do hecatombe nuclear, há um vislumbre das possibilidades da corrida espacial. Como a Terra se tornou quase inabitável, parte da população que não foi afetada pela radiação, acabou indo morar em algum ponto do espaço, pois aqui, o que muitos imaginavam possível tornou-se realidade: morar em algum outro lugar que não o planeta Terra.

Todo este cenário do a obra, mesclado a um avanço tecnológico forte, gerou uma espécie de um culto tecnoreligioso onde um ser, Mercer (notou o nome?), é levado a incutir em si aquilo que seria o maior dom do ser humano: a empatia. Inclusive, é um teste de empatia que serve para descobrir se um indivíduo é um robô ou não.

O que surpreende muito na narrativa, para quem viu o filme são os personagens. Apesar de os androides serem uma ameaça, ficam longe de serem tão assustadores quanto os de Ridley Scott. Tanto que a luta final entre Rick Deckar e Roy Batty, que é um dos pontos altos do longa eternizado pelo monólogo do replicante Roy:


"Eu vi coisas que vocês não imaginariam. Naves de ataque em chamas ao largo de Órion. Eu vi raios-c brilharem na escuridão próximos ao Portão de Tannhäuser. Todos esses momentos se perderão no tempo, como lágrimas na chuva"

não existem nos livros. Na verdade, este duelo final é resolvido de forma bem rápida. 

Até a questão que tanto debate gerou no longa, se Deckar era ou não um androide, no livro não tem muito espaço, ficando apenas em algumas páginas para logo ser resolvido. Agora, o que tanto o longa quanto o livro abordam de forma pontual é o papel da consciência e se isso seria ou não  suficiente pra afirmar se algo é ou não humano e isso faz com que o título do livro faça todo sentido - por isso usei o primeiro título do livro e não o que ficou homônimo ao do filme. 

Como todo ser consciente de sua existência e que tem seus anseios, somo tomados pelos mais diversos desejos e só o pressuposto de que existimos e pensamos na nossa existência como algo real é que faz com que tenhamos esses sonhos e anseios. Deckar sonha em ter um cabra de verdade - a que ele possui é uma bela imitação feita de metal. Ao aceitar o desafio de eliminar os Nexus-6, ele pretende comprar uma ovelha com o prêmio. Indo por essa premissa de anseios de uma mente que sabe que existe, é que é pergunta fica no ar: androides sonham com ovelhas elétrica? E se a resposta for sim, então, os androides eram seres vivos que apesar de uma constituição física distinta da do homem, também mereciam seu lugar na ordem do dia?

Em muitos casos, a realidade já concretizou o que muitos teóricos destilavam em suas histórias. Hoje, mais do que nunca, a ideia de que máquinas possam vir a ter consciência não é mera especulação. Para muitos pesquisadores é só questão de tempo. Como nos relacionaríamos com esse seres? Seremos escravos ou senhores ou, viveremos em pé de igualdade numa sociedade harmônica? 

Como toda boa ficção científica, "Androides Sonham com Ovelhas Elétricas", é daqueles livros que extrapolam a questão da realidade existente e nos impelem a pensar além mas sem esquecer que no final somos apenas humanos.  

Boa leitura.
Nota:
Livro: Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?
Páginas: 272
Autor: Philip K. Dick
Editora: Aleph
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[CRÍTICA] filme, Under the Shadow (Sob a Sombra)



DIREÇÃO: Babak Anvari

LANÇAMENTO: 22/01/2016

ANÁLISE FAST FOOD: Evidentemente que nós aqui, desta parte do globo, não estamos habituados a assistir filmes de origem iraniana. Principalmente, filmes de terror. Nesta produção feita em parceria de diversos países (Irã, Jordânia, Qatar, Reino Unido), vemos um retrato do cotidiano do Irã na guerra contra o Iraque na década de 1980 e uma alegoria que um evento deste tamanho pode causar na vida de gente comum.

Focado basicamente nas vidas de Shideh (Narges Rashidi) uma ex-estudante de medicina que durante a revolução cultural iraniana apoiou o lado errado, ou seja, o perdedor, e que agora fica impossibilitada pelo governo de voltar a estudar, e sua filha, Dorsa (Avin Mashandi), o filme vai mostrando o cotidiano delas ante a dificuldade, para o lado feminino de viver em uma teocracia, e o perigo da guerra em ação. A vida de ambas é mesclada em fazer as atividades que lhe são rotineiras e fugir para o porão quando do aviso de bombas inimigas.

A vida delas piora quando o marido de Shideh, Iraj (Bobby Naderi) é mandando para o front de batalha. Deste ponto em diante, a narrativa que se focava no aspecto real do conflito Irã/Iraque, começa a mudar para um escopo sobrenatural numa alegoria sobre as mazelas que a guerra trás.

Narrado de forma lenta, o longe imprime um tom sufocante de agonia ante o destino de nossas personagens. Desde a primeira cena quando Shiden tem seu "enésimo" pedido de voltar a estudar medicina negado pelo reitor da universidade, ou quando se apressa a esconder o aparelho de vídeo cassete que tem em casa, o filme trata de fazer um retrato do que foi (e talvez seja) viver no irã daqueles tempos. Apesar de não usar de nenhum discurso incisivo pra imprimir seu ponto de vista, o diretor deixa claro a injustiça e o equívoco de tais atitudes por parte do governo. E seguimos assim por grande parte do longa neste clima – o que pode deixar o telespectador que foi fisgado pelo trailer, um pouco decepcionado pelo ritmo narrativo.

Aos poucos, porém, quando o elemento sobrenatural é inserido, este tom claustrofóbico dá espaço para um gênero de terror numa tentativa de usar os mitos islâmicos dos Djinns, como simbolismo para as consequências e calamidades que uma guerra causa. Apesar de, neste ponto em diante, o filme perder um pouco do seu impacto, ele consegue, metaforicamente, apresentar um lado mais maligno e sombrio da guerra e isso, de usar alegorias para falar de um mal real, o cinema de terror consegue fazer como poucos gêneros, tornando assim mais palatável um enredo que seria indigesto para muitos de nós.

Tendo como ponto forte do longa a apresentação de um cotidiano difícil após a revolução cultural iraniana e a piora desta situação em tempos de guerra, o longa usa de alegoria de terror para reforçar a ideia do mal que a guerra trás na vida das pessoas que não pediram para que ela acontecesse. Pessoas que sem entenderem por que tem suas vidas reviradas e destruídas por entidades que não estão nem um pouco preocupadas com suas vidas, mas sim, em causar dano e tornar pior o que já era difícil. Assim como o mal causado pelos Djinns.


[CRÍTICA] filme, Snowden



DIREÇÃO: Oliver Stone
LANÇAMENTO: 10/11/2016
ANÁLISE FAST FOOD: Para quem já assistiu “JFK, A Pergunta Que Não Quer Calar”, sabe que Oliver Stone não costuma deixar espaço para dúvidas em seus filmes. O diretor escolhe uma linha e segue nesta fazendo quase que uma propaganda do tema. Por mais que a linha defendida pelo diretor possa ser questionada, não há como negar que ele entrega um trabalho eficiente.

Em Snowden não é diferente. 

[CRÍTICA] filme, A Garota no Trem


DIREÇÃO: Tate Taylor
LANÇAMENTO: 27/10/2016
ANÁLISE FAST FOOD: A Garota no Trem segue a mesma premissa de Garota Exemplar: mulheres que sofrem algum tipo de abuso dos homens e resolvem se rebelar.

O longa acompanha a vida de três personagens, Anna, Rachel e Megan, de forma não linear que se entrelaçam para forma uma história de reviravoltas, suspense e drama.

[RESENHA] Drácula, de Bram Stoker


Muito já foi feito dentro da ficção sobre vampiros. Muitos autores ousaram em dar uma roupagem nova a estes seres que tanto assustaram e maravilharam nossas mentes. Richard Matheson com seu bem sucedido “Eu Sou a Lenda” obteve sucesso com sua versão dos chupadores de sangue. Stephanie Mayer e sua Saga vampiresca, apesar de não obter o sucesso da crítica, conseguiu uma legião de fãs apaixonadas por seu vampiro purpurinado. Independente da forma que são apresentados, todos os autores bebem da fonte do maior vampiro que surgiu na literatura: Drácula. Aqui, o autor apresenta aquilo que seria – e é – o retrato que, ainda hoje, permeia nossas mentes quando falamos em vampiros. E o resultado é ótimo.   

[Top 10] Os Dez Melhores Livros de 2016



Olá pessoas!
Este ano, como fiz em 2015, elenquei os dez melhores livros que li no ano. Claro, vale lembrar que não são livros lançados em 2016 e sim, livros que li este ano.

Tive o prazer de ler alguns autores novos mas como foi dito por Sandoval no fantástico O Segredo dos Seus Olhos

"As pessoas podem mudar tudo:
 de cara, de casa, de família, namorada, religião, de deus. 
Mas há uma coisa que não se pode mudar, Benjamin. 
Não se pode trocar de PAIXÃO!!!”