[RESENHA] O Rei de Amarelo, de Robert W. Chambers



“Seu olhar caiu sobre o livro amarelo que Lorde Henry lhe enviara. O que seria isso, perguntou-se (...) após alguns minutos, estava absorto. Era o livro mais estranho que já havia lido. Parecia que, em vestes refinadas, e ao som delicado de flautas, os pecados do mundo desfilavam, em silêncio, diante dele. Coisas com que havia sonhado de modo vago tornavam-se reais para ele. Coisas que jamais imaginara eram-lhe reveladas.”
O retrato de Dorian Gray - Oscar Wilde

Robert W. Chambers foi um escritor que ficara recluso a um nicho muito restrito de leitores. Apesar de ter feito algum sucesso comercial com seus livros de banca, o que o alçou a um patamar de primazia na literatura foi sua incursão pelo terror através de sua Mitologia Amarela. Muitos escritores beberam da mitologia criada por Chambers em várias de suas obras – Marion Zimmer Bradley, H.P. Lovecraft, Neil Gaiman e Stephen King, são alguns exemplos  – mas, a velha ironia do universo quis que ele ficasse, de certa forma, como uma sombra pairando sobre páginas e mais páginas de escritores sem receber o devido reconhecimento do público por isso.

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Com o lançamento, em 2014, da série True Detective, que conseguiu um sucesso considerável graças ao roteiro enigmático, o tom sombrio e as atuações excelentes - Matthew Mcconague principalmente – e que fazem referências diretas à obra do autor. O Rei de Amarelo saiu das lavas do esquecimento possibilitando que um número maior de amantes da literatura tenham a oportunidade de conhecer esta obra ímpar.

O Rei de Amarelo é um livro de dez contos que apresentam uma estrutura interessante. Os quatro primeiros contos, “O Reparador de Reputações, “A Máscara”, No Pátio do Dragão” e “O Emblema Amarelo”, são contos de terror que tem como fio condutor uma peça (um livro fictício) que deixa louco quem lê. O Nome do livro: O Rei de Amarelo. Os dois próximos contos, “A deimoiselle d’Ys” e “O Paraíso do Profeta”, começam a deixar de lado o teor fantástico dos  primeiros contos servindo como transição para os quatro últimos de teor mais realista que tratam da vida boêmia nas ruas de Paris. São eles: “A Rua dos Quatro Ventos”, A rua da Primeira Bomba”, “A rua de Nossa Senhora dos Campos” e “Rua Barrée”. Esses quatro últimos devem ser um retrato dos livros água com açúcar pelo qual Chambers conseguiu manter-se financeiramente.

Terror Cósmico
Os quatro primeiros contos são todos enigmáticos. A ideia gira toda em torno de um livro que leva as pessoas que o leem ao limite da loucura ou a algo ainda pior. O primeiro conto dá uma espécie de introdução no tipo de terror e loucura que O Rei de Amarelo causa, culminando com o quarto conto onde as paredes da sanidade, da fé e realidade já foram todas dizimadas restando apenas um vazio sombrio e sem esperanças de salvação. Os contos são todos interligados trazendo-os para um mesmo espaço/tempo e isso exige muita atenção do leitor para não perder as várias referências deixadas pelo autor. Vale ressaltar que não temos contato com a peça. Temos apenas alguns vislumbres sobre seu conteúdo o que aumenta ainda mais o clima abstruso dos contos. Alguns termos são citados mas não há um aprofundamento maior por parte dos personagens, o que deixa o leitor no vácuo sem saber do que se trata isso ou aquilo. É uma forma  muito perspicaz de representar a impotência ante o poder do Rei. É como se fossemos também reféns desta obra maldita que, de um jeito sutil, mas intenso, permeia tudo de forma quase subconsciente.

Um Aviso Importante
Os outros contos do livro deixam de lado este terror de forma explicita, sendo assim, não espere encontrar pistas ou enigmas deixados de propósito pelo autor. Leia de forma despreocupada e aproveite a experiência. Há uma publicação do livro – que já caiu em domínio público – que apresenta apenas os quatro primeiros contos. Apesar de serem diferentes, os contos tem seu propósito de ser e não seria justo com você, leitor, e com o autor esta separação que limita a experiência.

Chambers não deu seguimento a sua “Mitologia Amarela” deixando uma infinidade de suposições que tornam  o debate acerca da obra mais intenso, frutífero e gratificante. É uma pena que obras com esta qualidade, precisem que um outro veículo se aproprie dela para que, só assim, o grande público venha a conhece-la. Ou, talvez seja bom: quem sabe nossas mentes não estejam preparadas para o horror de tais páginas e é melhor ficar no conforto da ignorância. 

Boa Leitura!
Nota:

Livro: O Rei de Amarelo
Páginas: 356
Autor: Robert W. Chambers
Editora: Intrínseca
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